Enquanto somos mais de 209 milhões de brasileiros, a população de animais de estimação chega a 132 milhões, de acordo com dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Não é de se espantar, portanto, que o país ocupe o terceiro lugar no ranking mundial de faturamento no setor pet, atrás apenas dos Estados Unidos e do Reino Unido, segundo a Associação Brasileira da Indústria de Produtos para Animais de Estimação (Abinpet). Para se ter ideia, em 2017, o saldo fechou em mais de 19 bilhões de reais, um crescimento que representa cerca de 7% se comparado a 2016.
O aumento considerável nesse setor da economia é apenas mais um indicativo do forte laço criado entre o homem e os bichinhos, que hoje são, para muitos, membros da família e, portanto, requerem cuidados e carinho. Aliás, esses são os únicos requisitos para quem quer ter um pet em casa, de acordo com o publicitário mineiro Rafael Mantesso, autor do livro “Um cão chamado Jimmy”. “É uma balança muito cruel quando se mensura o amor incondicional que eles te entregam, em troca de algo tão simples quanto água, comida e carinho”, conta. Ele, que agora vive em São Paulo, teve sua vida transformada depois de perceber que o amor estava nos pequenos gestos de seu cão, Jimmy Choo. Hoje, já livre do quadro de depressão, conta como o pet foi essencial para vencer os obstáculos.
Rafael Mantesso – Da depressão ao sucesso
Ao se deparar com um quadro de autismo que culminou no término do seu casamento, no fracasso do seu restaurante e em um apartamento sem móvel, que foram levados pela ex, Rafael Mantesso descobriu sua fonte inesgotável de amor e, também, um novo talento que viria a dar asas, literalmente, a sua vida. Sentado em companhia das paredes brancas e de Jimmy Choo, seu Bull Terrier, o desenhou como anjo na parede. Ele gostou da ideia e resolveu criar uma coleção de desenhos tendo seu cão como protagonista e, depois de uma postagem em seu blog, incialmente focado em gastronomia, viu seus números crescerem da noite para o dia. “Dormi com 10 mil seguidores e acordei com 70 mil, além de 16 mil e-mails, entre eles uma mensagem da CEO da Jimmy Choo”, conta.
Foi aí que tudo começou a mudar. A parceria com a luxuosa grife de sapatos que leva seu pet desenhado nas estampas foi licenciada em 36 países e lhe rendeu novos convites, entrevistas e trabalhos no universo da publicidade, como em maio de 2016, quando seu projeto ganhou o relevante prêmio Webby, em Nova York, na categoria fotografia em redes sociais.
Rafael saiu de um quadro de depressão, em que dependia da ajuda dos amigos para comer e hoje trabalha em uma agência em São Paulo. “O cachorro é uma forma de terapia. Eles não têm barreiras, preconceitos e o Jimmy supre todas as minhas carências afetivas”, relata. Para ele, seguir a rotina que o cão está habituado é o mínimo que pode ser feito. Hoje, as sessões de foto diminuíram, justamente, para garantir o bem-estar do pet.
Para eternizá-lo, Mantesso criou uma animação que dá voz ao amigo cão com episódios divulgados em suas redes. Mas, para ele, tudo isso ainda é pouco perto do que eles te dão. Por um ano, Rafael firmou uma parceria junto a uma marca de ração para doar 5 toneladas do alimento por mês para uma ONG e, hoje, contribui com outra organização com a doação de fotos do Jimmy para leilão, fotografando campanhas e desenhando produtos.
Rafael pode ter desenhado asas para Jimmy, mas antes mesmo ele já era seu anjo. “Fica difícil oferecer qualquer coisa perto do que eles oferecem para nós: a vida”, diz. Mas, o cenário invertido também existe: humanos que abrem mão, muitas vezes, do bem-estar próprio para resgatar um amigo e tranformar seu futuro.
Luísa Mell – Amor incondicional aos animais
A atriz Luisa Mell, de 39 anos, sentiu na pele o preconceito por ter adotado uma cachorrinha vira-lata, a Pricipessa, que depois passou a se chamar Dino. Ao mesmo tempo, viu também a força que esses bichinhos conseguem dar aos humanos nos momentos difíceis ao acompanhar o bem que a cachorrinha fez ao seu pai que enfrentava uma depressão. Em seguida, veio o programa Late Show, que ela apresentou na Rede TV! entre 2002 e 2008. Foi ali que ela se envolveu definitivamente com a causa animal. Tornou-se uma grande defensora dos indefesos bichinhos e, inclusive, comprou brigas com famosos e poderosos. No caso do Instituto Royal, que ganhou as manchetes de todo o país em 2013, ela ajudou a resgatar 178 cães que sofriam maus tratos.
Ao abraçar a causa, ela não imaginava quantos outros benefícios os pets levariam a sua vida. “Eles me ajudaram a vencer uma depressão profunda que veio com a crise dos 30 anos e quando fiquei desempregada”, revela.
Ao retomar o eixo de sua existência, ela concretizou um desejo de cuidar efetivamente dos bichinhos abandonados e maltratados e pouco tempo depois fundou o instituto que leva seu nome e acompanha de perto todo o processo de adoção. “Ao estar perto dos animais, vejo muita crueldade, o pior lado do ser humano, mas acompanho também histórias lindas de pessoas que se transformam por eles e para eles, cuidando, por exemplo, de cães idosos, cegos e paraplégicos com muito amor”, afirma ela que conta toda sua história no livro “Como os Animais Salvaram minha Vida”.
Breno Martins Jancowski – Os dois lados da moeda
Essa relação é mesmo um ciclo. O estudante de veterinária do Centro Universitário de Jaguariúna (UniFAJ), Breno Jancowski, acredita no poder de transformação dos humanos através do contato com animais e, também, na sua missão com eles. Então, uniu as duas causas. Em visita ao Lar dos Velhinhos de Campinas, ele conta sobre a experiência de seus projetos como forma terapêutica e de interação com os idosos. “A oportunidade de entrar em contato com os bichinhos retoma memórias, muda a rotina dessas pessoas e traz magia em forma de carinho e noção de responsabilidade”, relata. Baguera, a cadela que interagiu com os idosos no dia da visita, é fruto de uma adoção de Breno.
Mas, se engana quem pensa que ela foi a única atração. A porquinha do mato, Matilde, as cobras, lagartos, entre outros animais silvestres que Breno trabalha, trouxeram memórias da infância e divertiu os idosos. “Eu gosto demais dos animais porque morei no sítio Nem tenho medo de cobra. É bom poder lembrar da infância ”, diz Dona Maria Faria Neves, conhecida como Cotinha.
E o projeto se estende, também, no universo infantil. “Nós fazemos semanalmente um trabalho terapêutico com crianças com vários tipos de deficiência na Apae de Indaiatuba”. De acordo com ele, a curiosidade desperta o desenvolvimento infantil e os faz vencer medos e interagir de forma lúdica . “Uma menina aprendeu a contar com os insetos que levei”, se orgulha Breno.
A relação traz benefícios para os dois lados e fortalece o laço do homem com a natureza, um exemplo é o carinho e o cuidado do Breno com os animais é transmitido em forma de amor tanto para ele, quanto para as pessoas que fazem parte do projeto.
Coisa de gente grande
Muitos amam, poucos ajudam. As ONGs que abraçam a causa animal por meio de resgates e tratamentos são, hoje, as grandes responsáveis por mudar a vida de inúmeros bichinhos. Mas há, também, quem se joga na causa sozinha. São pessoas que fazem muito, com muito pouco. Que também enfrentam os bastidores mais dramáticos e crueis até encontrar um lar e possibilitar uma vida digna ao animal. Porém, a sobrecarga é intensa. “Alguém tem que fazer”, conta a estudante de Publicidade e Propaganda da PUC Campinas, Bruna Pimenta, que começou a resgatar animais desamparados desde criança. “Como estou no último ano de faculdade e as mensagens de pedido de ajuda são diárias, tive que diminuir os resgates. Foram apenas três esse ano, mas já resgatei mais de 100 sozinha”.
O grande problema, de acordo com ela, é não haver apoio do governo e nem de novas pessoas nessa missão. “São sempre as mesmas pessoas que ajudam e se uma deixa de fazer durante um ano, são mais de 50 animais impactados que deixam de ser salvos”, completa. A professora de inglês e empreendedora, Erika Mantovani, reforça o problema mencionado por Bruna. “Você não tem apoio. Na hora todo mundo incentiva, mas depois ninguém ajuda e eu não digo isso com rancor. Mas, sei que se eu resgatar, vai ser por conta e risco ou contar com as mesmas pessoas de sempre”.
Hoje, depois de passar por terapias e fazer tratamentos com medicamentos por conta de uma depressão e síndrome do pânico, Erika fez uma promessa para si que não iria resgatar animais neste ano. “Envolve muito tempo e dinheiro e eu acabo desfocando da minha vida para cuidar só dos animais”, conta. “Meu relacionamento acabou porque eu não conseguia sair para jantar e não parar para resgatar um cachorro”, completa. Hoje, ela se distanciou dos resgates e foca em projetos pessoais que não deixam o discurso de fora. “Estou abrindo uma empresa de maquigens veganas totalmente cruelty free com a minha filha, em que 1% será destinado para a castração em Campinas”. As OGNs estão lotadas, então o alerta fica para despertar o envolvimento de mais pessoas. “Damos carinho e eles devolvem muito mais. É o amor mais lindo que se pode receber. Não há olhar mais grato”, garante Erika.
SAIBA COMO AJUDAR! – ONGs Campinas
Amor de Bicho – amordebichoresgate.com.br
Focinho Abandonado – focinhoabandonado.com.br
Anjos de Rua – facebook.com/anjosderuaoficial
Associação Amigos dos Animais de Campinas (AAAC) – aaaccampinas.wordpress.com
Grupo de Apoio ao Animal de Rua (Gaar) – gaarcampinas.org